Nem craque, nem bagre: Apenas Guillermo Varela

Guillermo Varela esteve em campo em 1193 minutos com a camisa do Flamengo em 2023. Foram 16 jogos como titular. O uruguaio passou 34 jogos no banco sem ser utilizado. Não se adaptou a Vitor Pereira. Ouviu de Sampaoli que não seria opção. Não engrenou com Tite. Sofreu linchamento online e virou mais um a ganhar a alcunha de "bagre". Em 2024, tudo é diferente para o lateral. 

Varela já somou, em três meses, 1016 minutos em campo (sem contar os amistosos). Foram 12 partidas como titular. Marcou o primeiro gol, conquistou o primeiro título como titular. Ouviu de Tite que é "bom". Ganhou a confiança do treinador e vive uma temporada de afirmação no futebol brasileiro. 

Estigmatizar um atleta como "bagre" é tão fácil como decretar novos craques por meras primeiras impressões. Muito mais cruel, por outro lado. Mas estigmas fazem parte do mundo do futebol, esporte que idolatra e amaldiçoa da noite para o dia. Como a sociedade, já que é reflexo dela. Feito por ela e para ela. Com suas qualidades e falhas.

Varela entendeu isso. Teve formação nas categorias de base de clubes referência no mundo. Peñarol, Manchester United, Real Madrid. Quantos "bagres" conseguem "enganar" clubes desse nível? Não estamos aqui a chamar Varela de craque, veja bem. É exatamente o oposto. A luta é contra os exageros, nunca contra as críticas. 

Sem estigmas, fica a pergunta: como Varela foi do 8 ao 80 na Gávea? O aspecto tático tem um protagonismo grande em responder essa pergunta. Varela não se adaptou a jogar como ala no esquema de três zagueiros de Vitor Pereira. Atacar a profundidade nunca foi seu forte. Na seleção, na Europa, no Peñarol. O gol contra o Audax, neste Carioca, foi o primeiro como profissional na carreira (Varela só havia marcado pelo Real Madrid Castilla, time B do Real Madrid). 

Sem conseguir se adaptar a uma nova realidade, com suas falhas expostas jogo a jogo para a torcida, cada vez mais impaciente, Varela se tornou reserva. E foi de reserva a terceira opção com Sampaoli. O componente mental passou a jogar contra, também: Varela tinha dúvidas sobre sua sequência na Gávea. Era um jogador sem confiança. A briga em um treino com Gerson foi a explosão e a constatação que mentalmente o uruguaio não estava bem. 

2024, porém, foi uma página em branco. Varela ouviu de Tite que seria titular, recuperou a confiança, ganhou a companhia dos compatriotas De la Cruz e Viña e voltou a jogar como gosta: em uma linha de quatro, mais por dentro. A presença de Luiz Araújo, nesse quesito, ajudou muito. Não só pelo fato de o ponta jogar aberto na direita: Luiz Araújo tem intensidade e consistência para ajudar Varela na fase defensiva. 

Com Luiz Araújo aberto, Varela passou a jogar mais por dentro, abrindo o corredor para Fabrício Bruno iniciar a construção das jogadas na defesa. Tite reencontrou, com as nuances táticas, o lateral de seleção uruguaia, que vestiu grandes camisas na América do Sul e na Europa. Varela voltou a sorrir. Voltou a jogar futebol. Deixou o estigma de lado, mesmo sem ser um craque. É Guillermo Varela, (novo) lateral direito do Flamengo.